segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Caminhos tortuosos da mobilidade em Fortaleza


Ao revisitar informações sobre o Transfor, cujo contrato foi assinado em 2006, mas desde 1998 a proposta existe, vejo as louvações ao projeto como se dependesse somente dele a solução de todos os problemas de trânsito em Fortaleza. Ora, uma análise mais apurada pode lançar luz sobre as rotas espessas e amplas da complexa rede de (ou da falta de) mobilidade, reforço, humana na cidade. Porque é das pessoas que devemos cuidar. 

Dados do DETRAN-CE mostram a distribuição da frota de veículos no interior e na capital até dezembro de 2011. Os automóveis representam 37,6% da frota total, onde 57,6% estão em Fortaleza. Motocicletas já somam 43,1% da frota no Ceará, dos quais 23,8% são da capital. No caso de ônibus e microônibus apenas 0,39% e 0,75%, respectivamente, representam a frota desses veículos na cidade de Fortaleza. 

Dados do Anuário do Transporte 2010 da ETUFOR informam que a frota circulante de ônibus em dias úteis é de 1.745 veículos, aos sábados 68,6% e aos domingos 48,3% dessa frota atendem à população. Diante desses dados e de algumas mudanças propostas e em andamento pelo Transfor é possível termos noções claras sobre a situação de trânsito e transporte de Fortaleza. Será mesmo que o alargamento de vias, corredores exclusivos de ônibus, mais 30 km de novas ciclovias e uma maior integração do sistema de transporte coletivo é uma saída ousada e suficiente para o que enfrentamos nos deslocamentos diários na capital nos dias de hoje? Passados quase 10 anos, do projeto à sua finalização, as necessidades identificadas no estudo balizador do Transfor valem para a Fortaleza de hoje? Penso que nos estudos de demanda para o uso do transporte coletivo é necessário também políticas e ações de geração de novas demandas e mais usuários. 
É preciso ampliar para que mais e mais pessoas se sintam instigadas a deixar os seus veículos em casa e passem a usar o transporte público e os não motorizados, além de viagens à pé, para que possamos de fato ver acontecer no cotidiano a mobilidade viva, humana e sustentável para as pessoas e não apenas aos bolsos dos que lucram com a precariedade do transporte público. O Estatuto das Cidades prevê a obrigatoriedade de plano de mobilidade urbana para cidades com mais de 500 mil habitantes. 

O Plano Diretor de Fortaleza, Lei Complementar Nº 062, de 02/02/2009, prevê no Capítulo VI, Da política de Mobilidade Urbana, Art. 35., uma série de diretrizes desde melhorias no transporte público até cuidados com os passeios, os espaços para pedestres, pessoas com deficiência e/ou com mobilidade reduzida, além dos ciclistas. Prevê ainda que até 2011 fosse elaborado e executado Plano Diretor de Mobilidade de Fortaleza, onde houvesse a participação efetiva da população. 
Além disso, o Ministério das Cidades, em sua Secretaria de Mobilidade, publicou Guia de elaboração e execução de plano de mobilidade sustentável para cidades de médio e grande porte, PlanMob, onde orienta passo à passo os caminhos para que a mobilidade urbana possa de fato caminhar a passos largos em direção à cidades saudáveis, voltadas para as pessoas. Quando se pergunta o que fazer diante das idiossincrasias existentes hoje na mobilidade urbana de Fortaleza, o que tenho a dizer é: coragem, falta coragem de agir na linha da ruptura das lógicas individuais e privadas e sustentar uma posição de respeito e luta pela dignidade humana em todos os sentidos. 

Mobilidade é uma forma explícita, um termômetro das desigualdades sociais e econômicas existentes na cidade. Enquanto nossas calçadas, ruas e espaços públicos não forem lugares onde toda e qualquer pessoa se sinta respeitada ao utilizar, enquanto nossos transportes públicos não forem bons o suficientes para cada governante ou legislador utilizar em seu cotidiano, também não será para as pessoas, os trabalhadores, estudantes, idosos, pessoas com deficiência, na verdade, todos nós. 

O que fazer? Fazer! Estatuto das Cidades (2001), Plano Diretor Participativo do Município de Fortaleza (2009), Lei do Sistema Cicloviário de Fortaleza (2011), PlanMob (2007) e Política Nacional de Mobilidade Urbana (2012) são alguns dos referenciais marcantes que apontam saídas, modos de fazer das cidades espaços comuns, lugares bons de estar e também de se deslocar, sair de um lugar e ir a outros sem medo do que pode acontecer na esquina. O Transfor é uma medida válida, mas não é a única e não pode ser colocado como referencia de plano de mobilidade de Fortaleza, uma vez que mobilidade é muito mais do que isso.

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