terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Antes só… Uma aventura pra lá de emocionante no Ceará


O micro-ônibus que me levaria de Fortaleza a Jericoacoara prometia uma viagem agradável. Ar condicionado, poucos passageiros, cinco horas de novas paisagens através do vidro fumê. Cinco foi o que me informou a desinformada moça que me vendeu a passagem. Foram oito. 

Presenciei o milagre da multiplicação das horas e dos passageiros. Logo descobri que o coletivo era um pinga-pinga. Parava na menor cidadezinha que houvesse no trajeto. Gente de todo tipo subia e descia portando coisas as mais variadas, entre aves vivas, pacotes de sementes e outros insumos agrícolas, com seus odores peculiares. 

 Assim foi a ida. Mal sabia o que me esperava na volta. A estada em Jeri foi ótima, mas melhor teria sido se uma intoxicação alimentar não tivesse me derrubado nos últimos dias. Entrei no micro-ônibus um tanto desidratado e debilitado, mas disposto a relaxar, talvez tirar uma boa soneca. Desta vez, pelo menos, eu ia com o espírito preparado para as longas oito horas de estrada. Mas não para o Arlindo. 

 Tal figura subiu a bordo na segunda parada. Enfiou um grande saco plástico verde no compartimento de bagagens de mão, instalou-se no assento ao meu lado e puxou conversa. Como se pode imaginar, eu não estava nem um pouco a fim de papo. Mas ele estava, e muito. 

 Apresentou-se, disse que era pescador de lagostas. Contou que costumava ficar no barco por dias a fio e acabava de retornar de uma dessas jornadas de trabalho no mar. Estava explicada a necessidade de dialogar: eu era o primeiro não crustáceo com quem o rapaz tinha a oportunidade de trocar ideias em um bom tempo. 

 Aqui entra a agravante etílica. Sempre que o ônibus parava, o pescador descia para comprar cerveja. Eu aproveitava e fingia estar dormindo, mas era em vão. Ele me cutucava e oferecia uma latinha, que eu educadamente recusava. Então desatava de novo a, entre goles generosos, falar sobre a mãe, a irmã, a tia, o cunhado… Trivialidades num coletivo do Ceará. 

 A cena se repetia a cada parada. Ele cada vez mais ébrio e tagarela, eu exercitando a minha paciência de Jó. Apesar de não estar dando pano para manga, tampouco destratei o sujeito, e ele pareceu ficar contente com isso. Tanto que, em determinado momento, me encarou e disse:

 – Taí, gostei de você! É gente boa. Vou te dar um presente. 

 No mesmo instante, ergueu-se, alcançou o saco verde e o abriu. O que se seguiu foi surreal: pelas mãos dele, saiu de dentro do embrulho e veio pousar no meu colo uma enorme lagosta! 

 – Tá cozida e salgada, pronta pra usar. 

 Não sabia se ria ou se chorava, a situação era inusitada demais. Com esforço, balbuciei um agradecimento:  

– Puxa, não precisava… 

 Atônitos, os passageiros em volta olhavam para o bicho cheio de patas e antenas. 

 E o bicho olhava para mim.

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